A Lei 13.964/2019, denominada popularmente como “Pacote Anticrime” trouxe sensíveis mudanças nos Códigos Penal e Processual Penal.

Algumas dessas mudanças como é o caso da criação do “Juiz das Garantias” (que por ora está suspensa por decisão do Min. Luiz Fux) gerou polêmicas e ainda será terreno fértil para calorosos debates.

É inegável que a mini reforma (mais uma) imposta pela Lei 13.964/2019 trouxe necessárias mudanças ao direito penal e processual penal,  e outras apenas deram uma interpretação mais literal e por vezes redundante aos dispositivos modificados, como é o caso do art. 25 do Código Penal que versa sobre legítima defesa.

É que a Lei 13.964/2019 acrescentou o parágrafo único ao art. 25 do Código Penal, estendendo aos agentes de segurança pública a possibilidade de agir em legítima defesa de vítimas reféns durante a prática de crimes.

Todos sabemos que a legítima defesa é uma das excludentes de ilicitude previstas na Parte Geral do Código Penal, as outras são: Estado de necessidade (art. 23, I e art. 24 CP); Exercício Regular de Direito (Art. 23, III do CP) e Estrito Cumprimento do Dever Legal( Art. 23, III do CP).

Todas elas tem algo de comum: a moderação e a  proporcionalidade da força necessária para repelir a justa agressão, a aplicação da lei e os riscos inerentes ao fato praticado.

Portanto, na nossa opinião o novo parágrafo único do art. 25 do Código Penal é redundante e desnecessário já que o agente policial ou de segurança pública, ao repelir agressão injusta já estará abarcado pelo disposto no art. 23, III primeira parte do Código Penal.

Vejamos o que diz o dispositivo:

Art. 23 – Não há crime quando o agente pratica o fato:

I – em estado de necessidade

II – em legítima defesa

III – em estrito cumprimento do dever legal ou no exercício regular de direito.

É de conhecimento geral que o agente de segurança pública tem o dever legal de agir quando toma conhecimento de um crime ou está diante de uma situação de flagrante delito (art. 301 do CPP), e sendo assim não é diferente quando ele se deparar com a situação em que precisará agir para repelir agressão ou risco de agressão contra vítima de crime.

O próprio texto do caput do art. 25 do CP não distingue o agente, seja ele um cidadão comum ou um agente de segurança pública, ambos poderão ser beneficiados com a excludente de ilicitude prevista no art. 23, II do CP, caso necessite agir com moderação para repelir injusta agressão.

É completamente redundante e desnecessária a inclusão do parágrafo único do art. 25 CP. Primeiro, porque o caput do próprio dispositivo não faz diferença de agentes, podendo qualquer um agir em legitima defesa, sendo agente de segurança pública ou não.

Segundo, pois já existe no ordenamento jurídico a excludente de ilicitude que protege o agente de segurança pública quando ele age conforme o estrito cumprimento do dever legal, desde que com moderação.

O nosso posicionamento é no sentido de que o acréscimo do parágrafo único do art. 25 do CP é uma tentativa de legitimar ações mais violentas dos agentes de segurança pública conforme a atual política criminal, e digo isso sem nenhum viés partidário, até porque não é o meu papel como advogado, mas sim tendo em mãos os números divulgados pelo ISP (Instituto de Segurança Pública) informando que as mortes praticadas por agentes de segurança pública aumentaram em 20% em 2019.

De outro modo, o agente de segurança pública sempre pôde agir em sua legítima defesa ou de terceiros, assim como não é punível a sua conduta quando age no estrito cumprimento do dever legal, ou até mesmo no exercício regular de direito, desde que aja de forma moderada e com a força adequada e contraposta à agressão que esteja sofrendo ou na eminência de sofrer.

Por fim, reiteramos que o acréscimo do parágrafo único do art. 25 do CP na prática não altera a análise do caso concreto, onde o magistrado deverá se debruçar sobre o conjunto probatório para chegar a conclusão se estão ou não presentes algumas das excludentes de ilicitudes prevista na lei penal, principalmente quanto ao uso moderado da força necessária.