Música, diversão, fantasia, purpurina, alegria e multidão. Tudo isso permeia o clima carnavalesco. No entanto, apesar de muitas pessoas se divertirem nessa época do ano, o Carnaval também tem seu lado sombrio para muitas mulheres que sofrem com toques indesejados, insistências e violação de seus corpos.
O carnaval deste ano será o primeiro em que a importunação sexual é crime. De acordo com a lei 13.718/18, publicada em setembro do ano passado, importunação sexual é o ato de praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro. A pena para quem praticar este crime é a reclusão de 1 a 5 anos, se o ato não constituir crime mais grave.
E as cantadas?
Muitos foliões consideram esta época do ano mais permissiva para determinados comportamentos, principalmente no que se refere ao clima de azaração. Na arte da conquista, estão as famosas cantadas. Mas, será que elas se encaixam no crime de importunação sexual?
Para Fernanda Maria Alves Gomes, mestre em Direito pela UFPE, não. De acordo com a professora, a mera cantada, desacompanhada de ato libidinoso, não caracteriza o crime de importunação sexual. “Para sua tipificação exige-se a prática de ato libidinoso contra alguém, o que não ocorrerá na simples cantada por mais agressiva ou chula que seja”, explica.
O promotor de Justiça aposentado/SP e mestre em Direito Público, Eudes Quintino de Oliveira Júnior, também avalia a questão. Ele explica que a lei erigiu a dignidade sexual com um valor relevante da pessoa e, nesta área protetiva, deferiu a ela a tutela específica garantindo-lhe instrumentos legais para fazer valer o seu direito.
Eudes Quintino esclarece que uma “cantada”, que tem como vítima o homem ou a mulher, desde que contenha os elementos de seriedade e que possam provocar a perturbação e o transtorno da pessoa a quem foi direcionada, compreende a prática do crime de importunação sexual.
A lei traz o conceito de ato libidinoso, mas, afinal, o que seria isto? Eudes elucida que, quando a norma fala deste tipo de ato, ela pretende traduzir a intenção do agente em querer satisfazer sua libido, valendo-se, para tanto, de toques corporais em partes íntimas do corpo humano, sem, no entanto, consumar o ato sexual.
O criminalista Luiz Augusto Filizzola D’Urso, professor da FMU, alerta ainda que “mesmo que estas cantadas não configurem o crime de importunação sexual, dependendo de seu teor, o indivíduo pode estar cometendo crime, sim. Por exemplo, o crime de injúria e o crime de difamação, caso a cantada ofensiva seja dita em voz alta e na presença de outras pessoas”.
Depois do não é tudo assédio
O Poder Público tem se atentado para a gravidade do assédio sexual contra as mulheres, principalmente nesta época do ano em que o número de denúncias aumenta. Prova disso é a campanha criada pela prefeitura de Vitória/ES, que lançou campanha na qual busca conscientizar a população sobre o tema.
A campanha traz frases de alerta como “Sexo sem consentimento é estupro”, “Depois do “Não” tudo é assédio” e “O corpo dela não é sua folia”.
Nara Borgo, secretária de Cidadania, Direitos Humanos e Trabalho, acredita que, por conta do machismo, a mulher ainda é a maior vítima de violência.
“O comportamento machista ainda acha que uma mulher não pode usar uma fantasia e pular carnaval apenas para se divertir. Ele acredita que ela está disponível e, com isso, pode assediá-la livremente sem ser punido. E isso precisa mudar. São dicas importantes que vamos publicar nas nossas redes sociais para alertá-los de que depois do ‘Não’ é tudo assédio”.
Fonte: Migalhas. nº 4.550
Data: 26.02.2019
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