Uma das maiores fontes de injustiças e erros judiciários no processo penal brasileiro é sem dúvidas, provocada pelas falhas nos procedimentos de reconhecimento e identificação de suspeitos, quase sempre no âmbito do inquérito policial.
A Lei 12.037/2009 disciplina a identificação criminal através do procedimento fotográfico, que nada mais é do que a inclusão da fotografia no suspeito no inquérito policial.
A referida lei também faz alusão a identificação do perfil genético, que inclusive sofreu algumas alterações pelo Pacote Anticrime (já tratamos deste assunto em outro artigo).
Já o art. 226 do Código Penal, normatiza como a identificação do suspeito deve ou deveria ser realizada.
Art. 226. Quando houver necessidade de fazer-se o reconhecimento de pessoa, proceder-se-á pela seguinte forma:
I – a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva ser reconhecida;
Il – a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la;
III – se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento, por efeito de intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa que deve ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela;
IV – do ato de reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais.
Parágrafo único. O disposto no no III deste artigo não terá aplicação na fase da instrução criminal ou em plenário de julgamento.
Chamo a atenção para o inciso II, que é um dos procedimentos mais utilizados nas delegacias de polícia, e que nem sempre são devidamente observados.
Na prática o delegado quase sempre determina que outros policiais ou serventuários da delegacia, estagiários e até mesmo outros presos fiquem lado a lado com o suspeito, e muitas vezes essas pessoas tem fisionomia diferentes, levando a vítima identificar o suspeito de forma errônea.
Outra forma de reconhecimento sempre utilizada sem o mínimo cuidado, é a identificação por fotografia, onde o policial mostra para a vítima a foto do suspeito, sem nenhuma outra ao lado, “forçando” um reconhecimento ilegal.
Muito embora parte da jurisprudência entenda que os procedimentos apontados no art. 226 do Código de Processo Penal sejam apenas recomendações legais, sendo que em tese poderiam ser utilizados outras forma de reconhecimento, a nossa posição é contrária.
Entendo que os procedimentos adotados tanto na fase policial quanto na judicial, devem ser realizados com todo o cuidado, garantindo assim as liberdades individuais do suspeito.
O processo penal é composto de formas, e formas são garantias contra qualquer arbitrariedade, e sendo assim não há espaços para improvisos ou informalidades que possam minimizar o direito a ampla defesa.
Em suma o reconhecimento por fotografia é sempre prejudicial ao investigado, pois é comum que o ato seja executado com diversas falhas, como por exemplo a indução da vítima ou testemunha a reconhecer aquele sujeito como o que praticou o crime.
Muito embora a lei não diga exatamente como deverá ser feito o reconhecimento pela fotografia, se espera da autoridade policial o mínimo de idoneidade, para que pelo menos esta forma de reconhecimento seja submetida como a de reconhecimento pessoal, ou seja com outras fotos de pessoas com as mesmas características físicas do suspeito. Via de regra não é o que acontece.
Assim, temos que o reconhecimento fotográfico além de ser maneira ineficaz para o reconhecimento de pessoas, ainda viola o direito de ampla defesa do suspeito/acusado e muitas vezes colabora para que haja erros judiciários irreparáveis.
Obviamente não sou contra a prova lícita obtida por meio de reconhecimento pessoal, mas essa deve ser de caráter indiscutível, não há espaço para dúvidas ou talvez e para isso o procedimento deve ser feito de maneira absolutamente correta, meticulosa e transparente.